GEOPOLÍTICA CONTEMPORÂNEA

14. GEOPOLÍTICA CONTEMPORÂNEA

A palavra geopolítica foi um termo definido no início do século XX pelo jurista sueco Rudolf Kjellén ao se referir às preocupações do Estado em relação às estratégicas político-militares necessárias à manutenção da soberania territorial e à expansão de sua área de influência econômica e cultural em nível regional e mundial.

Nesse sentido, a geopolítica nos remete a vários assuntos, desde as ações de guerra entre os países, com a ampliação de suas capacidades bélicas, o recrutamento de contingentes militares, disputas ideológicas entre regimes econômicos diferentes (como ocorreu entre o socialismo e o capitalismo) até a defesa de patrimônio e recursos naturais essenciais ao desenvolvimento econômico de cada nação.

Assim como a questão ambiental, a geopolítica é atualmente reconhecida como um campo de estudos interdisciplinares, pois as estratégias de disputas de poder estão envolvidas por aspectos ideológicos, econômicos, bélicos, etc., o que faz com que a geopolítica integre as discussões que permeiam o trabalho de diferentes profissionais, como geógrafos, historiadores, economistas, cientistas políticos e sociais, e militares. (BOLIGIAN & ALVES, 2004).

A Nova Ordem Mundial

Os Estados são os principais atores da política mundial, juntamente com as diversas instituições “públicas multilaterais”, como a ONU, FMI, Banco Mundial, OMC, etc., estas originadas a partir das decisões dos próprios Estados. O sistema internacional é um sistema de Estados soberanos com a característica principal básica da ausência de um poder geral, ou seja, de um “governo mundial” capaz de impor regras universais, sendo que, em princípio, todos os Estados estão sujeitos à agressão externa.

Por esses e outros motivos, o objetivo principal da política externas dos Estados é a redução da insegurança, desenvolvendo estratégias para incrementar sua segurança, por meio da ampliação do seu poder econômico e militar, da criação de organizações internacionais e de tratados e alianças com outros Estados (MAGNOLI & ARAÚJO, 2005).

Primeiramente, surge no século XVII, após a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648) uma configuração na Europa conhecida como um sistema multipolar, este perdurando até as duas grandes guerras do século XX, que assinalaram o declínio das grandes potências europeias.

As grandes guerras e a organização geopolítica mundial A 2a Guerra Mundial foi um conflito armado que envolveu diversos países entre 1939 e 1945, e teve como palco principal o continente europeu e o Leste/Sudeste Asiático. Com este fato histórico, houve grandes mudanças no cenário geopolítico internacional, pois envolveu as principais potências econômicas da época, travada basicamente por dois grupos de países: de um lado, a Alemanha, a Itália e o Japão (países do Eixo); e, do lado opositor a estes países, estavam os Estados Unidos, a União Soviética, a Inglaterra e a França (países Aliados).

Passada mais de meia década de intensos combates, os países do Eixo foram derrotados: primeiramente a Itália (1943), logo depois a Alemanha nazista de Adolf Hitler (maio de 1945) e, em seguida, o Japão (agosto de 1945). A rendição deste último deu-se após o lançamento de duas bombas atômicas pelos Estados Unidos nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, ação que colocou fim ao conflito e que também serviu para amedrontar o mundo, demonstrando o poderio bélico do país norte-americano.

Após a guerra, os grupos confrontantes não existiam mais. No seu lugar, emergiu um sistema internacional baseado na rivalidade entre os EUA e a URSS (União Soviética). Esse sistema bipolar distinguia-se do antigo, demonstrando uma rivalidade entre as superpotências que produziu a divisão geopolítica da Europa e também influenciou, as relações entre os outros Estados da Ásia, África e América Latina, situação que perdurou, teoricamente, até o final da década de 1980. Os EUA passaram a liderar o conjunto dos países que se desenvolviam sob o sistema econômico capitalista; e a URSS, o bloco dos países que aderiram ao sistema socialista.

A efetivação das áreas de influências geopolítica soviética e norte-americana no continente europeu (principal alvo das duas superpotências) deu origem à divisão entre Europa Ocidental (países capitalistas aliados aos EUA) e a Europa Oriental (com países socialistas aliados à URSS). A partilha dos países derrotados na Segunda Guerra Mundial foi o início das disputas entre EUA e URSS, como foi no caso da Alemanha.

Na Conferência de Potsdam, realizada meses antes do fim da guerra, os países Aliados estabeleceram zonas de controle dentro da Alemanha já derrotada. Assim, existiam 4 zonas de domínio estrangeiro em território alemão, principalmente na capital, Berlim, considerada de grande importância estratégica. Dessa forma, a Alemanha encontrava-se sob o domínio de três Estados capitalistas (França, Inglaterra e EUA) e um Estado socialista (URSS), como pode ser observado na figura. A figura mais evidente da Guerra Fria foi a criação do Muro de Berlim que demonstrava esta divisão entre capitalistas e socialistas.

166
                                                                       Alemanha pós II-Guerra Mundial
167
                                                             Capital Berlim e a divisão por blocos.

A Europa Ocidental e a Europa Oriental, antes de serem espaços definidos pela geografia ou pela história, foram fruto da geopolítica. A fronteira estratégica representada pela

Cortina de Ferro passou a separar os dois espaços antagônicos da época: o Ocidente capitalista e o Oriente socialista. As instituições internacionais desempenharam um papel importantíssimo na estruturação desses espaços. A OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), aliança militar criada em 1949, e a Comunidade dos Estados da Europa (CEE – atual União Europeia) funcionaram como pilares da Europa Ocidental. O Pacto de Varsóvia, aliança militar fundada em 1955, e o Conselho Econômico de Assistência Mútua (Comecon), estabelecido em 1949, funcionaram como pilares da Europa Oriental. Com a exceção de alguns Estados neutros de economia capitalista (Ex.: Suíça) e da Iugoslávia e Albânia, todos os demais países do continente colocaram-se à sombra das superpotências (MAGNOLI & ARAÚJO, 2005).

168
Cortina de ferro e a separação da Europa

Caracterizada por conflitos indiretos, a Guerra Fria foi marcada pelas disputas entre os blocos capitalistas e socialistas.

Os EUA, que viam o fortalecimento político e militar soviético como uma séria ameaça à sua hegemonia no mundo, passaram a criar estratégias que pudessem impedir a expansão do movimento socialista na Europa e na Ásia. Entre essas estratégias, destacou-se o chamado Plano Marshall, que, a partir de 1947, passou a destinar recursos financeiros para a recuperação econômica dos países europeus afetados pelas guerras.

Com o capital investido pelos EUA, boa parte dos países europeus conseguiu reerguer sua infraestrutura interna. E, com a condição de grande credor destes países, possibilitou aos norte-americanos colocar as nações europeias em uma situação subordinada aos seus interesses estratégicos durante muitos anos. Como resposta a esta investida dos EUA, a URSS efetivou sua influência sobre os países do Leste Europeu apoiando o estabelecimento de governos com a orientação socialista, utilizando muitas vezes suas forças militares para tal.

O envolvimento em conflitos regionais e a formação de alianças militares levaram as duas superpotências a uma acirrada corrida armamentista, como forma de alcançar um equilíbrio de poder em escala mundial. Ambas acreditavam que, quanto mais bem equipadas militarmente, mais protegidas estariam de qualquer ofensiva inimiga. Os gigantes arsenais bélicos desenvolvidos durante a corrida armamentista foram instalados nos territórios das superpotências nucleares, assim como nos países com os quais firmaram tratados, além de pontos considerados estratégicos.

As rivalidades e disputas entre EUA e URSS também marcaram o esporte mundial. Nos jogos olímpicos, a maior manifestação esportiva envolvendo os países do mundo, a busca por medalhas parecia indicar a busca pela superioridade ideológica. Os boicotes aos jogos também marcaram a influência política no esporte. Os norte-americanos não participaram das Olimpíadas de Moscou (1980) em protesto à invasão do Afeganistão pela URSS. Ocorreu o contrário nas Olimpíadas de Los Angeles, em 1984. (BOLIGIAN & ALVES, 2004).

Durante a Guerra Fria, não existiram confrontos diretos entre EUA e URSS. Porém, entre seus aliados, o que não faltaram foram conflitos internos e regionais: a Guerra da Coreia (1950-1953), a crise da Hungria (1956), Macartismo (década de 1950), o movimentos dos não-alinhados (1955-1956), a Guerra do Vietnã (1960-1975), a crise de Cuba (1959- 1962), a Primavera de Praga (1968), conflito entre China e URSS (década de 1960), dentre muitos outros.

Fim da Guerra Fria: “nova ordem” multipolar mundial

Em meados da década de 1970, a URSS já dava sinais claros de esgotamento econômico. Diversos fatores contribuíram para essa situação: a excessiva burocratização e a estrutura centralizadora do Partido Comunista, que controlava o Estado, o setor tecnológico tornou-se obsoleto e de baixa qualidade em relação ao restante do mundo, a dificuldade do diálogo dentro do partido socialista, as insatisfações dos Estados, que resistiam fortemente à tentativa da imposição dos padrões russos, a queda da produtividade agrícola, dentre outros.

Com o início da crise na URSS, em 1985, Mikhail Gorbatchev assumiu o governo e iniciou um amplo programa de reformas, dentre os principais, destacam-se a Perestroika (reestruturação econômica) e a Glasnost (transparência política marcada pela flexibilização das restrições políticas na tentativa de incentivo da participação popular na tomada das decisões política dos países). No entanto, esses programas foram insuficientes, pois surgiram tardiamente, quando os problemas haviam se tornado demasiadamente graves e a situação do país mostrava-se cada vez mais complicada (BOLIGIAN & ALVES, 2004).

Somaram-se a esses problemas as fortes pressões exercidas pelos EUA e por outras potências capitalistas para a abertura política e econômica, e a democratização dos países socialistas. O aprofundamento da crise, em 1991, culminou na extinção da URSS, colocando, assim, um “ponto final” na Guerra Fria e na ordem geopolítica mundial bipolar.

Com o final da Guerra Fria, ocorreu uma mudança substancial no cenário mundial, no qual o poder estratégico concentra-se nos EUA, mas existiam diversos grandes polos de poder econômico. Os EUA dispõem, nesta época, de influência geopolítica e poderio bélico inigualáveis, tornando-se a superpotência global. Entretanto a economia global torna-se policêntrica, formando polos concorrentes nas finanças e no comércio internacional: EUA, União Europeia (antiga CEE) e a Ásia Oriental com o Japão como centro.

O presidente norte-americano da época, George Bush, aproveitou a desagregação da URSS, em 1991, para proclamar uma “nova ordem mundial”, que estaria fundamentada no poder incontestado dos EUA. Porém os conflitos nacionais pós-Guerra Fria e as desigualdades entre Norte e Sul, impulsionadas pelo fenômeno da globalização, revelaram os elementos de uma verdadeira “desordem mundial” (MAGNOLI & ARAÚJO, 2005).

Além dos principais polos de poder, existem atualmente polos importantes que se encontram em situação geopolítica indefinida e passam por diversas mudanças por conta de conflitos internos, como a CEI (Comunidade dos Estados Independentes) e a China.

Os países da CEI, assim como a maioria dos países que romperam com o regime socialista totalitário vêm passando por um período de difícil transição para a economia de mercado capitalista. Porém, apesar dos problemas enfrentados durante o período de transição a Rússia, destaca-se, dentro da CEI, como a maior potência econômica regional por seu vasto arsenal nuclear herdado da Guerra Fria, tendo em vista que essa vantagem sobre as demais nações da região tem levado o governo russo a buscar novas relações internacionais para o estabelecimento de um novo espaço geopolítico sob seu domínio.

A China, não passou por crises na transição econômica com os outros países que fizeram o mesmo percurso. Muito pelo contrário, encontra-se em um rápido processo de desenvolvimento econômico, podendo vir a se tornar, segundo especialistas, a nação sócio-político-econômica mais desenvolvida do mundo, no século XXI.

Tal fato deve-se à implantação do modelo de economia socialista de mercado, onde um conjunto de medidas que, adotadas pelo governo chinês a partir da década de 1970, possibilitaram a flexibilização da economia, permitindo a entrada de capitais e de tecnologia estrangeira. Além disso, foram dadas às empresas estatais maiores autonomias em relação às prioridades de produção impostas pelos planos periódicos e a possibilidade de investirem no desenvolvimento de tecnologias e em bens de consumo mais modernos.

Porém, apesar desse conjunto de medidas, o governo chinês continua sendo extremamente centralizador e autoritário no que diz respeito às questões políticas internas (vale lembrar que o comunismo continua no país e não existe liberdade democrática).

CONFLITOS REGIONAIS E INTERNACIONAIS

O ideal nacionalista difundido na Europa do século XIX, pelas elites nacionalistas que lideravam movimentos populares lutava pelo estabelecimento do Estado nacionalista soberano, como foi o caso da Revolução Francesa por exemplo. Tiveram seu apogeu ao final da 1a Guerra Mundial. Após a 2a Guerra Mundial, o nacionalismo transformou-se em bandeira de luta dos movimentos anti-colonialistas na Ásia e na África, onde os impérios europeus nestas áreas sofreram com a contestação dos povos que queriam se tornar nações soberanas. Este processo de descolonização gerou a criação de diversos Estados independentes.

Os conflitos nacionais só vieram a crescer juntamente com o sentimento nacionalista, difundido cada vez mais pelo mundo. Estes formam um dos elementos mais ativos do sistema internacional de Estados. Interna e externamente, os conflitos se deflagram há muito tempo e não parecem “querer” acabar.

Conflitos europeus

Os conflitos no centro e leste da Europa estão relacionados ao fim dos governos socialistas de cunho centralizador e autoritário, os quais foram implantados em diversos países dessa região após a Segunda Guerra Mundial. No entanto, a história da diversidade e dos conflitos étnicos na região é antiga. Ela resulta da expansão dos impérios Russo, Otomano e Austro-Húngaro, e da decomposição desses últimos entre o final do século XIX e as duas primeiras décadas do século XX.

Os principais conflitos ocorridos na Europa são: Conflitos dos Bálcãs (desmembramento da Iuguslávia – 1991), a independência da Bósnia (iniciada em 1992 e com seu fim em 1995), a Guerra de Kosovo, a luta dos Bascos (disputas no Norte da Espanha e Sul da França, liderados pelo grupo socialista ETA), a questão da Irlanda (divisão do território irlandês em Irlanda do Norte e República da Irlanda)

Conflitos no Oriente Médio

Por volta do século III d.C., os romanos expulsaram os judeus do que se convencionou chamar de Terra Santa. Em 1897, após um encontro sionista, os judeus decidiram voltar a ocupar a Palestina, que, na época, pertencia ao Império Otomano. Imediatamente, teve início a emigração judaica para o local onde viviam cerca de 500 mil árabes. Em 1903, estima-se que já somavam 25 mil judeus vivendo em meio à comunidade árabe. Em 1914, pouco antes da Primeira Guerra Mundial, eram 60 mil e em 1948, após a Segunda Guerra Mundial e pouco antes da criação do estado judaico, somavam 600 mil.

No decorrer dessa emigração, já ocorriam conflitos e, à medida que a ocupação aumentava, tornavam-se mais constantes e violentos. A Segunda Guerra Mundial contribuiu para esse quadro, já que milhares de judeus fugiram do regime nazista na Europa. Em 1947, a recém criada ONU sugeriu a criação de um “estado duplo”, um árabe e outro judeu, com Jerusalém como “enclave internacional”. Como era de se es perar, os árabes não aceitaram a proposta.

No dia 14 de maio de 1948, Israel declarou independência. Egito, Síria e Líbano se opuseram e atacaram, mas foram derrotados. Em 1967 Israel decidiu expandir o seu território, na chamada Guerra dos Seis Dias, derrotou Egito, Síria e Jordânia e conquistou de uma só vez a Cisjordânia, as Colinas de Golã e a parte leste de Jerusalém. Em 1973, Síria e Egito lançaram uma ofensiva contra Israel, no feriado conhecido como Yom Kippur (Dia do Perdão), mas foram novamente derrotados.

Em 1987, aconteceu a primeira Intifada (sacudida ou levante, em árabe), quando milhares de jovens foram às ruas protestar contra a invasão de Israel, que, inclusive, foi considerada ilegal pela ONU. Os israelenses atiraram e mataram crianças que jogavam pedras nos tanques, provocando comoção internacional. A segunda ocorreu em 2000, quando o então primeiro ministro israelense, Ariel Sharon, caminhou nas redondezas da mesquita de Al-Aqsa, considerada sagrada pelos muçulmanos, e parte do Monte do Templo, considerada sagrada por judeus e muçulmanos.

Atualmente, o conflito está longe de ser resolvido, pois Israel permanece nos territórios invadidos e se nega a sair, em desobediência à resolução 242 da ONU, que obriga o país a se retirar das áreas ocupadas durante a Guerra dos Seis Dias. Do outro lado, grupos radicais palestinos se negam a reconhecer Israel como estado e lançam uma série de atentados contra os judeus.

Em 2006, houve eleições legislativas na Autoridade Nacional Palestina (não existe um estado árabe propriamente dito) e o Hamas as venceram. Nessa ocasião votaram eleitores da Faixa de Gaza, Cisjordânia e Jerusalém oriental. O problema foi que, apesar da democracia ter prevalecido, o Hamas não reconhece o estado judaico e, novamente, Israel e Estados Unidos lideraram uma pressão internacional para impor sanções e suspender a ajuda internacional ao povo palestino. A exigência era de que o Hamas aceitasse o estado de Israel e dividisse o poder com o Fatah, o que, obviamente, o grupo não aceitou.

Os protestos no mundo árabe nos anos de 2010 e 2011, também conhecidos como a Primavera Árabe, surgiram em uma série de conflitos ocorridos no Oriente Médio. Tudo começou em fevereiro no Egito quando a população saiu as ruas exigindo a deposição do ditador Inspirada na Hosni Mubarak. Foram 18 dias de protestos intensos nas ruas para que o Egito visse a queda de Mubarak, que cedeu às pressões e renunciou, pondo fim a um regime autoritário de três décadas.

Os protestos no Egito sofreram a influência direta da chamada Revolução de Jasmim, na qual os jovens da vizinha Tunísia conseguiram forçar a derrubada do presidente Ben Ali, uma semana antes. Tal movimentação popular inspirou outros países do norte da África e do Oriente Médio a fazer o mesmo.

Até a data, além das revoluções na Tunísia e no Egito, também existe uma guerra civil na Líbia; grandes protestos também na Argélia, Bahrein, Djibuti, Iraque, Jordânia, Síria, Omã e Iemen, e protestos menores no Kuwait, Líbano, Mauritânia, Marrocos, Arábia Saudita, Sudão e Saara Ocidental. Os protestos têm compartilhado técnicas de resistência civil em campanhas sustentadas envolvendo greves, manifestações, passeatas e comícios, bem como o uso das mídias sociais, como Facebook, Twitter e YouTube, para organizar, comunicar e sensibilizar a população e a comunidade internacional em face de tentativas de repressão e censura na internet por partes dos Estados.

Geopolítica e o Meio Ambiente

A questão ambiental tem ocupado um papel cada vez mais relevante nas relações internacionais contemporâneas.

A negociação e implementação de tratados, acordos, convenções e a realização de reuniões internacionais com agendas amplas e complexas – como a RIO-92 – dão contornos a um sistema internacional multilateral imerso em conflitos e contradições. Novos processos emergem no cerne da dinâmica capitalista e contribuem para uma nova geopolítica global, como o fim da Guerra Fria, a reestruturação produtiva, a globalização econômico-financeira, a propagação da ideologia neoliberal e os avanços tecnológicos e científicos, principalmente no campo da biotecnologia.

Algumas temáticas ambientais, cujos impactos extrapolam as fronteiras dos Estados Nacionais, têm surgido com maior destaque na política internacional e influenciado a (re) configuração da geopolítica mundial. Neste sentido, podemos mencionar, na esteira do agravamento da crise ambiental mundial, problemas como a diminuição da camada de ozônio, a mudança do clima global, a perda da biodiversidade, a poluição dos ambientes marítimos e a devastação das florestas, além dos múltiplos desafios relacionados à água e à energia. A geopolítica contemporânea caracteriza-se, dessa maneira, pelo que Marília Steinberger definiu como “relações de poder de vários atores sobre o território”, extrapolando a perspectiva clássica de poder centrado exclusivamente no Estado. Bertha Becker, por sua vez, lembra que a geopolítica sempre foi marcada pela presença de pressões de todo tipo, intervenções no cenário internacional – desde as mais brandas até as guerras e as conquistas de territórios. Esta geopolítica atua, hoje, sobretudo, por meio do poder de influir a tomada de decisão dos Estados sobre o uso do território (RODRIGUES, 2011).

A geopolítica contemporânea e o meio ambiente se entrecruzam, portanto, não somente nas tensões em relação ao território em si, mas também no tocante às possibilidades de seu uso. O território entendido a partir de uma dimensão de fonte e de estoque de recursos naturais traduz-se na possibilidade de acesso ou de restrição. Em outras palavras, a partir do controle do território, lócus estratégico de poder, é possível permitir ou impedir o uso de riquezas naturais, normatizando também atitudes e comportamentos. Berta Becker faz referência à assimetria de poder internacional para asseverar a existência de uma disputa das potências pelos estoques das riquezas naturais, uma vez que a distribuição geográfica de tecnologia e de recursos é desigual. Segundo ela, “enquanto as tecnologias avançadas são desenvolvidas nos centros de poder, as reservas naturais estão localizadas nos países periféricos ou em áreas não regulamentadas juridicamente”. Podemos considerar que poder e território – o último entendido em suas dimensões não só material, mas também simbólica – possuem interfaces que dialogam e se interpenetram, estando cada vez mais imbricados frente à crise ambiental.

A apropriação e o uso das riquezas naturais passam a ser almejados por distintos atores, cada qual com suas intencionalidades e perspectivas de ação.

Um exemplo são os debates sobre “bens públicos globais”, correspondentes a riquezas naturais que deveriam ser compartilhadas entre todos os seres humanos, independentemente das fronteiras políticas e jurisdicionais existentes.

Se, por um lado, considera a amplitude da escala dos problemas ambientais, a ideia de proteção compartilhada de riquezas naturais globais despertam, por outro lado, várias divergências políticas entre os países na medida em que esbarra no conceito tradicional de soberania internacional e na autonomia de organização do uso do território. (RODRIGUES, 2011)

Nas últimas décadas, os processos cooperativos internacionais surgem com a promessa de que podem ter papel  relevante na promoção do desenvolvimento econômico, social e ambiental dos países. Em contraponto à ajuda internacional meramente assistencialista – presente, por exemplo, nas políticas americanas preconizadas pelo Plano Marshall no período pós-Segunda Guerra –, emerge uma nova roupagem para a cooperação internacional, na medida em que teria capacidade de proporcionar benefícios que extrapolariam a fronteira dos Estados nacionais e que proporcionariam soluções “coletivas” para problemas comuns, como a crise ambiental global. Entretanto, um grande desafio ainda permanece como elemento precípuo da geopolítica global face à crise ambiental: desenvolver um sistema internacional mais justo e igualitário entre povos e países.